Adriano, o Imperador

à(s) 02:08

segunda-feira, 27 de abril de 2009


O apelido já o acompanhará até ao fim da carreira, aconteça o que acontecer. Adriano é o Imperador porque domina. Mas esse domínio não é o domínio comum ao jogador 'normal', quando recebe a bola de um companheiro. O melhor Adriano era aquele que dominava a bola, a equipa, o adversário, o próprio jogo. Por isso o 'Imperador'.
O avançado brasileiro explodiu quando Ronaldo, 'o fenómeno', atravessava um período de menor fulgor. O futebol precisava de um novo monstro, se chegasse do Brasil melhor. Adriano justificava o epíteto e a expectativa. Chegado ao Inter, oriundo do seu Flamengo, com 19 anos e depois de uma grande época no 'Mengão', a sua primeira época na Europa foi difícil. Natural, porque o Calcio não será o melhor habitat para um jovem brasileiro explodir na sua primeira época europeia. Fiorentina primeiro, Parma depois acolheram Adriano e o que se viu foram golos e grandes exibições. O potencial tinha-se confirmado, o futebol do brasileiro precisava de se afirmar numa equipa de primeiríssima linha, o regresso ao Inter foi algo natural.

No regresso, as duas primeiras épocas no clube foram excelentes. Para sua infelicidade, Adriano encontrou um Internazionale transformado numa verdadeira sociedade das nações. E que qualitativamente não fazia jus à história do clube. Contudo, o brasileiro explanou o seu melhor futebol, tornando-se na estrela da equipa. Robustez física, fortíssimo em espaços reduzidos, uma técnica muito apurada e um remate destruidor com o pé esquerdo. A média de golos situava-se em números elevados, e a equipa girava muito à sua volta. Porque além de balançar as redes adversárias, o 10 era mestre em assistir para golo ou em segurar jogo, esperando pela subida dos companheiros.

2006 foi o ano negro, que representou a viragem entre o fantástico Adriano e aquele que só apareceu a espaços. A sua capacidade psicológica foi insuficiente para aguentar a trágica morte do pai. A péssima performance do Brasil no Mundial 2006 tornou-o num dos bodes expiatórios, por ser um dos jogadores em que os adeptos depositavam maiores esperanças. E o seu futebol atingiu um ocaso, o qual Roberto Mancini foi incapaz de ajudar a ultrapassar. A partir dessa época, o melhor Adriano pouco se viu. Pouquíssimos jogos em Itália, chegando aliás a ser emprestado ao São Paulo, numa metade de época sabática, quase em reabilitação, sem realizar qualquer jogo oficial. Em toda a carreira, foi na Selecção Brasileira que se deu melhor. No 'Escrete' conserva uma média de golos superior a meio por jogo. A explicação talvez seja simples, é no gramado brasileiro, rodeado de 'brincas na areia' por todos os lados, que o Imperador se sente mais perto da favela brasileira, do futebol de rua.

2008/2009 seria a época que todos esperavam como a do seu regresso à melhor forma. Ou não fosse treinado por José Mourinho. A verdade é que esta foi desde início uma relação complicada, com demasiados altos e baixos. O melhor Adriano viu-se pouco, e mesmo a capacidade técnica parece ter saído afectada pelo alheamento do jogo constante que o brasileiro demonstrava. Os mísseis saídos do pé esquerdo viram-se menos, por consequência os golos também.
O início de Abril foi fatídico no que diz respeito à sua carreira no Inter. A recusa em voltar a Itália, depois de um jogo da Selecção brasileira. A confirmação de que nem Mourinho tinha conseguido fazer o jogador reentrar nos eixos do total profissionalismo. E a rescisão de contrato no dia 24 de Abril. Uma perda imensa para o futebol europeu.

Adriano transportou para o discurso e para as atitudes, parte daquilo que o seu futebol tinha de melhor. A descontracção, alguma irresponsabilidade, o risco. O seu comportamento não se coaduna com o de um jogador profissional. Mas estou longe de o censurar. O brasileiro foi atrás da sua felicidade. E ela está na favela, no calor, no calção largo, na cerveja, no churrasco. E no meio de tudo isto, nas partidas de futebol profissional, algures nos campos brasileiros. Por isso não duvido que o melhor Adriano vai regressar. Seja no imediato no Brasil, ou futuramente, se sentir a falta de maior competitividade, num país mais latino como Espanha, quiçá Portugal.
A verdade é que em toda esta estória, há um lado positivo. Num futebol cada vez mais robotizado, numa indústria cada vez mais sedenta de ídolos, num mundo por vezes excessivamente competitivo e enganador, Adriano mostra a muitos jovens que a felicidade, a realização, podem estar noutro lado, numa outra forma. Porque existem cada vez mais miúdos perdidos por uma ilusão que não se tornou em tudo o que esperavam, que não conseguem alcançar. O futebol não é só os milhões, as capas de jornal e revistas, a fama, a exposição. Ele pode ser só um jogo de rua, um estado de descontracção. Adriano é a prova.

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